terça-feira, 28 de junho de 2022

Cavaco, Sócrates e Rendeiro.

Sempre que Cavaco Silva dá uma entrevista ou publica um artigo, faz estragos. Nem que os estragos se limitem a pôr toda a gente a falar disso, desde os vários comentadores políticos das rádios e televisões, até ao 1.º Ministro e ao Presidente da República. Basicamente, Cavaco Silva desafiou António Costa a fazer mais e melhor do que ele fez, nos dez anos de maioria absoluta que teve como 1º Ministro. António Costa estará no cargo ainda mais tempo, e apesar de ter atravessado, e bem, uma pandemia, vai ter à sua disposição muitos milhões da “bazuca europeia”, tal como Cavaco Silva teve também muitos milhões vindos na altura da “CEE”.

Cavaco Silva não conseguiu deixar de responder à provocação de António Costa quando no discurso de tomada de posse no governo disse “Faço parte de uma geração que se bateu contra uma maioria existente que, tantas vezes, se confundiu com um poder absoluto.” António Costa, agora que tem uma maioria absoluta nas mãos, quer de certa maneira descansar os portugueses. Pessoalmente não gosto de maiorias absolutas, não gostei das de Cavaco e também não gostei da de Sócrates. Foi a partir daí que o PS começou a ter tiques de arrogância e prepotência, e que ainda hoje conserva. E António Costa devia lembrar-se… afinal, era o seu número dois.

Mas o artigo de Cavaco Silva não é só uma resposta à provocação de António Costa, é também um sinal de alerta para dentro do seu partido. O PSD, que acaba de eleger um novo líder, Luís Montenegro, precisa mesmo de se orientar e traçar caminho se pretende sobreviver. Na minha humilde opinião, o PSD já entrou num caminho muito difícil de inverter e as circunstâncias políticas nacionais e internacionais em nada o ajudam. A continuar este clima de guerra, de perda de poder de compra, de inflação e de insatisfação social, só há um partido que poderá ganhar terreno, aquele que alguns “até têm medo de dizer o nome”, o Chega.

Se Cavaco Silva tem o dom de agitar as águas, José Sócrates consegue fazer transbordar o copo! Apesar de estar sujeito à medida de coação de termo de identidade e residência, que implica que o arguido comunique ao tribunal sempre que se vai ausentar do país mais de cinco dias, José Sócrates tem viajado para o Brasil várias vezes, e por lá se mantém durantes muitos dias, sem dar “cavaco” a ninguém! Segundo o seu advogado, Sócrates não tem de prestar esclarecimentos a ninguém pois a medida de coação não envolve nenhuma restrição da liberdade. Sócrates está no Brasil a fazer um doutoramento em Relações Internacionais na Universidade Católica de São Paulo. (Não lhe valia a pena ir para tão longe, em Lisboa também tinha esta possibilidade, a mesma universidade e o mesmo doutoramento). Dizem as más-línguas que Sócrates está no Brasil a ajudar o seu amigo Lula da Silva a voltar a ser Presidente. Dizem também que Sócrates nunca mais vai voltar a Portugal, e mesmo que seja condenado pode mesmo nunca ser extraditado, e tem duas possibilidades: casa com uma cidadã brasileira, ou espera que o seu amigo seja eleito Presidente e lhe atribua o título de cidadão de mérito. Quem tem amigos, tem tudo. E é mesmo com os amigos que vai terminar esta crónica. João Rendeiro, condenado em Portugal e que tinha fugido para a África do Sul, suicidou-se na cadeia. Apesar de ter dito há uns tempos que não voltaria para Portugal, acabou por voltar, embora não por sua vontade. No seu funeral estiveram cerca de vinte pessoas. Figuras públicas estiveram duas, o advogado Ricardo Sá Fernandes e o ex-ministro Mira Amaral. Se há um ano João Rendeiro tivesse promovido uma festa teria a casa a abarrotar de amigos, daqueles bem conhecidos da política, da televisão e da alta finança. As pessoas não deixam de ser más, ou bandidos ou criminosos só porque morreram. Assim devia ser com os amigos, mas não é. Sábias palavras as de Confúcio: “Para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade.”


Crónica publicada na edição 435 do Notícias de Coura, 21 de junho de 2022.



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