terça-feira, 21 de maio de 2019

A crise inventada!


Não queria nada gastar esta crónica a falar de educação, mas enquanto não me surge outra ideia vou escrevendo. Se daqui até ao final da folha me surgir algo melhor eu apago isto tudo e recomeço.
António Costa demonstrou esta semana ser um político inteligente. Uso a palavra inteligente no sentido mordaz da palavra, é provavelmente o político mais inteligente da atualidade, um exemplo de 1.º ministro que conseguiu ser nomeado sem ganhar eleições e, tal como se previa, conseguiu “enganar” o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português até ver aprovado o seu quarto e último Orçamento de Estado. Obviamente que tanto o BE como o PCP sabem que foram “enganados*”. Obviamente que preferem isso a deixar a direita voltar ao poder.
Esta jogada política, digo, crise política lançada por António Costa, resulta da vontade de todos os partidos políticos, com exceção do PS, de reconhecerem aos professores o tempo que trabalharam durante o tempo de congelamento das carreiras. Ao contrário do que têm dito alguns dirigentes do PS, nunca em tempo algum os professores pediram retroativos monetários. Esta é uma das mentiras, ou não-verdades como agora alguns políticos dizem, de virar a opinião pública contra a classe docente. Outra das não-verdades aos ventos anunciadas é a de que o PS nunca se comprometeu a reconhecer esse tempo aos professores, está na Resolução 1/2018 da Assembleia da República, basta ler. Não façam de nós estúpidos por favor. Por fim, refiro mais uma das não-verdades, os valores adicionais de despesa. Quase todos eles falsos, pois são tão diferentes entre os anunciados por António Costa, Mário Centeno e demais políticos, que dificilmente haverá quem não esteja errado! Mas nisto das contas, Mário Centeno tem revelado ser um verdadeiro malabarista. Mário Centeno Ministro das Finanças de Portugal é um verdadeiro mestre a dar a volta ao Mário Centeno, Presidente do Eurogrupo!
Por fim, uma última palavra para os dirigentes da oposição: Rui Rio e Assunção Cristas demonstraram bem a credibilidade que têm. E mais palavras não merecem.
Como até este momento não me ocorre nada melhor para escrever, vou deixar o texto como está, e largar um último desabafo: Sou professor há mais de 20 anos. Estou no segundo escalão de uma carreira de dez. Recebo menos agora do que em 2008! Se Portugal não voltar a ser alvo da Troika, vou-me reformar lá para 2044, isto se até lá durar (coisa que sinceramente não acredito!), e nessa altura devo estar a meio da tabela remuneratória, terei trabalhado quase 50 anos! Apesar de tudo isto, não pensem que não gosto da minha profissão, gosto muito! Mas toda este descrédito que a classe docente tem sofrido nos últimos anos faz-me olhar para a minha profissão como isso mesmo, a minha profissão. A forma de trabalho que remunera a minha vida. E é assim que tem de ser. Temos a obrigação de ser profissionais, fazer o melhor que sabemos, mas nada mais que isso. O tempo de trabalhar fora de horas, por amor à camisola ou por amor à causa pública, já lá vai. E não há ninguém que tenha o direito de o questionar. Ninguém.
 Quando esta crónica chegar aos leitores a crise política já passou, estará tudo na mesma. O povo continuará como sempre esteve, conformado, e provavelmente feliz pois o Benfica certamente já será campeão. As eleições europeias estarão à porta, e os resultados voltarão a ser os mesmos, desde 1974 que não variam muito, por que raio haveriam agora de mudar?



* o autor utiliza a palavra “enganados” no sentido mais inocente da palavra. Quem engana fá-lo pelo bem da nação, quem se deixa enganar também.


Crónica publicada na edição 363 do Notícias de Coura, 14 de maio de 2019.