terça-feira, 12 de março de 2013

Inês-de-Castro

Todos quantos andaram na escola, lembram-se certamente de um dos episódios mais tristes, mas também mais belos da história de Portugal: o amor de D. Pedro e Inês de Castro. Para os mais esquecidos, aqui fica uma breve lembrança:
Estávamos em 1340 quando Inês de Castro chegou a Portugal. Era aia de D.ª Constança que vinha para casar com D. Pedro, herdeiro do trono português. Pouco tempo depois, D. Pedro apaixona-se perdidamente por Inês, e nem o nascimento do seu 1.º filho, fruto da relação legítima com a sua mulher Constança, faz esbater este sentimento. O Rei D. Afonso IV não gosta das atitudes do filho, teme que as relações com Castela se tornem demasiado débeis, e manda exilar Inês de Castro da sua corte em 1344. Em 1345 D.ª Constança morre, D. Pedro fica viúvo e livre para fazer de Inês de Castro sua mulher, mas nada disto parece suficiente para alterar as vontades do seu pai, o Rei. Este não consegue defender-se das pressões dos seus conselheiros, e acaba por mandar matar Inês de Castro em 1355. Em 1357 D. Pedro foi aclamado Rei e pouco tempo depois anunciou que se tinha casado com Inês de Castro antes da sua morte. Os assassinos de Inês de Castro foram capturados e brutalmente executados. Conta a tradição que D. Pedro mandou desenterrar o corpo da amada, coroando-a como Rainha de Portugal, obrigando os nobres a proceder à cerimónia do beija-mão real ao cadáver. A prova deste amor é ainda visível hoje no Mosteiro de Alcobaça, onde os túmulos dos dois se encontram lado a lado, para que, “no dia do juízo final, os eternos amantes então ressuscitados, se vejam imediatamente”. D. Pedro reinou durante 10 anos e foi tão popular ao ponto da população dizer “que taes dez annos nunca ouve em Portugal”.
Estamos em 2013, passaram mais de 650 anos, e os tempos que vivemos aproximam-se de forma assustadora do final desta história, senão vejamos:
- Existe um 1.º ministro, que por coincidência, ou talvez não, também se chama Pedro, apaixonou-se pelo país e com a bênção do povo, conseguiu casar-se com ele. Entretanto, vinda de reinos mais longínquos que os de Castela chegou a Troika. Esta, não se apaixonou por Pedro, mas conseguiu convencê-lo que era a conselheira essencial para fazer perdurar o seu amor por Portugal. As suas palavras, conselhos e indicações foram de tal modo convincentes que Pedro, tudo fez e tudo deu. Algumas vezes, com receio que a nova conselheira o abandonasse, até superou as suas exigências, castigando aqueles que tinham feito mal à sua amada.
E assim se foram passando os primeiros anos, Pedro estava tão absorto na sua missão, que se esqueceu de olhar para a sua amada, de lhe falar, de a questionar sobre os seus desejos, sobre o seu estado, no fundo, de lhe perguntar: - Como te sentes?
Um dia, a conselheira vai despedir-se de Pedro e dizer-lhe: obrigado, fizeste tudo quanto te foi pedido. E então Pedro vai voltar-se para a sua amada, para o seu país, e perceber horrorizado o que aconteceu. Vai compreender que todos os que foram castigados, se calhar não o mereciam, ou pelo menos não eram eles os principais responsáveis por tudo o que de mal tinha acontecido. O povo tem alguma culpa do estado do país, se calhar até tem muita culpa, mas não pode ser ele o único visado. Pedro vai perceber, quando olhar para as metas colocadas pela Troika que cumpriu com distinção o que lhe foi pedido. O défice vai estar controlado, as contas públicas minimamente estáveis, a máquina do estado mais leve e funcional, e até as agências internacionais, aquelas que gostam de nos classificar como “lixo”, vão acreditar mais em nós. Mas vai perceber também, que estará casado com um país moribundo, pobre, desanimado e demasiado frágil para viver histórias de amor.
Gostava que Pedro acordasse a tempo de impedir uma nova história como a primeira que contei. Não gostava de o ver casado com um país morto, não gostava de daqui a 650 anos ver os seus túmulos lado a lado, não gostava de o ver durante 10 anos nos destinos do país, sob pena do povo voltar a dizer “que tais dez anos nunca houve em Portugal”.
Vejo-me obrigado a esclarecer alguns dos leitores destes meus textos, que escrevo sem qualquer disfarce cultural, sem qualquer orientação política ou preferência clubística. Quando em causa está o país, e principalmente as pessoas, tudo o resto não tem importância nenhuma.
Para estimular a vossa curiosidade, e criar em todos o desejo do ler o meu próximo texto, ficam para uma próxima crónica as interessantes semelhanças entre o Portugal do reinado de D. Dinis e a freguesia de Linhares em Paredes de Coura.

Crónica publicada na edição 223 do Notícias de Coura, 5 de março de 2013.