terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Obrigado Sr. Presidente

Esta crónica foi escrita no primeiro dia deste novo ano. Nesse dia, Mário Soares estava ainda internado no Hospital da Cruz Vermelha, em “coma profundo e com prognóstico muito reservado”. Quando estas palavras chegarem aos leitores é provável que já lá não esteja, é bastante provável até que já esteja onde todos nós, mais tarde ou mais cedo, também iremos parar. Se porventura tal não acontecer também não fico muito admirado, Mário Soares foi sempre um lutador, quem combateu a ditadura durante tantos anos é bem capaz de combater a morte durante muitos dias. 
O nome de Mário Soares entrou para as minhas memórias no longínquo ano de 1986, era eu uma criança de 11 anos e lembro-me da alegria com o que o meu Pai entrou em casa, vindo do café e gritando: - Ganhou o Soares, o Mário Soares ganhou! Em 1991 lembro-me de andar a gritar “Soares é fixe”, nessa altura tinha apenas 16 anos e ainda não podia votar. Em 2005 Mário Soares candidatou-se novamente à Presidência da República. Todos sabemos porquê, o erro monumental do PS em não apoiar Manuel Alegre custou-nos dez anos com Cavaco Silva na Presidência. Mas adiante. Essa candidatura deu-me a possibilidade de poder votar nele para Presidente, e assim o fiz, embora tivesse que fazer mais de 700 km num só dia para me deslocar à minha secção de voto, o agradecimento estava finalmente feito. 
Mário Soares lutou pela liberdade de Portugal como poucos, não só antes do 25 de abril como depois. Não fosse a sua coragem em enfrentar o PCP no verão quente de 75 e simplesmente Portugal teria passado de um regime ditatorial para outro de sinal contrário, o nosso país ter-se-ia transformado sem dúvida numa espécie de Cuba da Europa. A ele lhe devemos também a entrada em 1986 na CEE, atual União Europeia, Portugal é hoje o que é em termos de infraestruturas rodoviárias, ferroviárias, empresarias, etc. graças aos fundos comunitários que caem nos cofres do país todos os dias, muitas vezes mal aplicados é certo, mas isso também é outra conversa. Importante também foi a sua decisão de ter chamado o FMI por duas vezes para nos salvar da bancarrota, quando o país vive com dinheiro alheio não se pode dar ao luxo de fazer festas e não pagar as dívidas. (Também José Sócrates foi sensato quando o fez em 2011, pena ter sido tão teimoso e esperado tempo demais, mas isto também são outras conversas). 
Mário Soares é muitas vezes condenado pela condução do processo que levou à descolonização. Acusam-no de não se ter preocupado com a situação de mais de 1 milhão de Portugueses que teve de regressar à metrópole. Talvez tenha sido descuidado, apesar de também a minha família de lá ter vindo, eu com poucos meses depois de ter nascido em Angola, não lhe guardo rancor, aquilo que ele fez foi devolver as colónias aos seus povos. Houve muitas guerras depois disso é certo, alguns ainda hoje são o que sabemos, mas isto de existirem países colonizadores não faz sentido nenhum, cada país deve pertencer aos seus. 
Todos temos defeitos e virtudes, e Mário Soares é certamente um exemplo disso, mas por tudo o que foi, por tudo o que fez por Portugal, é sem dúvida uma das maiores figuras da história, e assim será para sempre. 

Para mim, o Dr. Mário Soares será sempre o meu Presidente.

Crónica publicada na edição 309 do Notícias de Coura, 10 de janeiro de 2017.