quarta-feira, 24 de julho de 2013

Beethoven em Paredes de Coura!

Ilha Terceira, são 10 da manhã, hora local, a bordo do A330 da TAP ouve-se o inconfundível “hino à alegria” de Beethoven. Fico parado a ouvir até que sou interrompido por uma hospedeira que me pergunta se preciso de ajuda para arrumar a bagagem. Não preciso, obrigado, respondo sorrindo. Nesse momento não estou dentro do avião, estou no Centro Cultural de Paredes de Coura, na noite de 19 de junho.
Nessa noite, desceram às terras de Coura as partituras de Rossini, Bach e Beethoven e as estrelas adormeceram sob o embalo do talento de algumas crianças.
Nesta audição de final de ano dos alunos do Agrupamento de Escolas de Paredes de Coura que frequentam o Curso Básico de Música da responsabilidade da Academia de Música de Viana de Castelo, não foram só revisitados alguns dos mais talentosos compositores clássicos como os acima mencionados. Uma das grandes virtudes destes momentos é sempre a ousadia de aliar ao lado clássico dos instrumentos a contemporaneidade de temas recentes, especialmente algumas bandas sonoras imediatamente reconhecidas aos primeiros acordes.
Que coragem! Trabalhar com crianças de 11, 12, 13 anos, ensinar-lhes a tocar violino, violoncelo, oboé, trompete, saxofone, guitarra, entre outros, e depois trazer ao palco temas dos ColdPlay, Phil Collins, Paul McCartney, e os inconfundíveis temas das bandas sonoras do Titanic, do Pirata das Caraíbas e da Pantera Cor-de-rosa, é mais que coragem, é loucura!
Mas é deste tipo de loucura que o país precisa, é este tipo de cooperação entre as instituições que possibilita chegar mais longe, proporcionando as oportunidades que as crianças precisam e merecem. Parece que ainda foi há tão pouco tempo que este ensino da música começou, e a verdade é que já estão formados os primeiros alunos do curso básico de música.
Não posso deixar de fazer umas ligeiras comparações com esta escola, e aquela que foi a minha, há mais de 20 anos. Naquela altura, a escola traduzia-se numa mera executora do currículo nacional. Não havia atividades extra curriculares, clubes de xadrez, ou informática, ou leitura, era coisa que não tenho memória, a única música que aprendíamos era nas aulas do Professor Edmundo, Maestro da Banda Musical! Lembro-me de se fazer uma visita de estudo por ano, à Barragem dos Pisões, era sempre a mesma, e idas ao teatro ou cinema, nem em sonhos! Da única coisa que me lembro e que constituía uma oferta alternativa e motivadora era o desporto escolar, esse já existia, e proporcionava saídas bem interessantes! Este discurso não é revelador de nenhum tipo de ciúme quanto às oportunidades do presente, sinto uma grande alegria pelo facto delas existirem, e acreditem, se tivesse uma oportunidade destas, podem ter a certeza que a aproveitava!
A academia de Música de Viana de Castelo vangloria-se por “dar à luz” o fruto de cinco anos de trabalho no ensino da música. O Agrupamento de Escolas de Paredes de Coura orgulha-se de ver partir algumas destas crianças, e de ter contribuído para que possam seguir este caminho “musical”, agora ainda com mais afinco e sentido de responsabilidade.
No final da noite, somos precocemente acordados pelo som dos aplausos, os merecidos aplausos que voltam a silenciar as memórias destes antepassados compositores. E mais uma vez aquilo que sinto é que soube a pouco, soube a muito pouco. E isto acaba por ser bom, porque é com mais vontade ainda que espero ansiosamente pela próxima audição.


Crónica publicada na edição 231 do Notícias de Coura, 16 de julho de 2013.