terça-feira, 26 de outubro de 2021

O apagão

O passado dia 4 de outubro foi marcado por um “acontecimento dramático”, Facebook, Instagram, Messenger e WhatsApp estiveram em baixo durante várias horas, inacessíveis a milhões de utilizadores desesperados. Segundo informações posteriores da empresa tratou-se de um problema originado por alterações às configurações dos servidores. Uma falha meramente técnica deu para perceber até que ponto está o mundo, estamos todos, tão dependentes das redes sociais e das suas conexões. Foram vários os relatos de pessoas que acharam que o problema era da sua internet ou dos seus equipamentos, e os reiniciaram várias vezes sem no entanto conseguir resolver o problema. Eu próprio, confesso, também acabei por desligar e ligar a conexão à rede, não fosse o problema ser meu. Na verdade, aconteceu numa tarde em que me encontrava em Trás-os-Montes a “cortar lenha”. Como não andava com o telemóvel no meio das giestas, arrancava meia dúzia delas e depois verificava se o Instagram já funcionava (estava a tentar publicar uma fotografia), como não dava, pegava novamente na machada e no serrote e cortava mais umas quantas giestas. A vantagem do problema ter durado toda a tarde foi o azar das giestas, e a sorte dos meus Pais que ficaram com lenha para duas semanas! No Pai Tirano, na falta dos pastéis de camarão e dos rissóis de carne bebiam-se dois copos de vinho branco, eu, na falta do Instagram, cortava mais umas giestas!

Quem ganhou com este problema foi o Twitter; durante todas estas horas foi a rede escolhida para milhões de utilizadores se manterem “vivos” nas redes sociais, e foram milhares os memes criados para gozar com a situação. Entre eles, a verdadeira causa do apagão: “Zuckerberg tropeçou nos cabos de rede e desligou tudo”! Num outro, irónico mas assustadoramente verdadeiro, vê-se Zuckerberg a dizer: “Vou desativar todas as redes sociais para vocês viverem um pouco!” Uma das piadas mais engraçadas que me lembro de ver (infelizmente não me lembro de quem, mas era um jogador de futebol), onde ele afirmava: “Durante o apagão do facebook aproveitei para falar com a minha esposa, e pareceu-me boa pessoa!”

Piadas à parte, mais do que um entretenimento as redes sociais são um negócio de milhões, a empresa de Zuckerberg perdeu num só dia mais de 6 milhões de dólares; por outro lado, o Telegram, um serviço de mensagens instantâneas (parecido ao WhatsApp), ganhou mais de 70 milhões de novas adesões. Como em tantas coisas na vida, "a desgraça de uns faz a felicidade de outros".

Alguns especialistas em comportamento humano alertaram para a importância deste apagão, muitas pessoas aperceberam-se de como de facto estão dependentes das redes sociais, da necessidade de as consultar 20 ou 30 vezes por dia, e do medo de estarem sozinhas. Ao mesmo tempo, muitas experienciaram uma sensação de alívio, ao perceber que não estavam a perder nada porque simplesmente nada estava a acontecer! Anna Lembke, professora de psiquiatria e ciências comportamentais da Universidade de Stanford afirma que “embora o vício em redes sociais não esteja atualmente incluído na categoria de transtorno mental, as redes sociais são viciantes.” O terapeuta John Duffy, recomenda mesmo uma “desintoxicação digital de um mês para desenvolver uma relação mais consciente com as redes sociais.” Segundo afirma, depois disto as pessoas passam apenas 1/3 do tempo nas redes sociais, e aumentam a sua autoestima.

Não será fácil nos dias que correm, principalmente porque os telemóveis são hoje um instrumento de trabalho, e a menos que os deixemos em casa, é inevitável sempre que pegamos nele irmos espreitar o que se passa nas redes sociais, é a curiosidade humana a trabalhar! Talvez fruto destes últimos acontecimentos, e das acusações dos efeitos negativos do Instagram na saúde mental dos jovens, o Facebook revelou que vai introduzir ferramentas de controlo parental para obrigar os jovens a fazerem uma pausa. Talvez já nem seja necessário… há cada vez mais jovens “agarrados” ao TikTok!

Crónica publicada na edição 419 do Notícias de Coura, 19 de outubro de 2021.

terça-feira, 12 de outubro de 2021

Resultados eleitorais

Esta foi uma crónica em que não me preocupei minimamente com a necessidade de arranjar assunto. Tive a sorte de ter de a escrever no fim-de-semana das eleições legislativas, e portanto bastou esperar até serem anunciados os resultados eleitorais para arranjar vários pontos interessantes para umas quantas linhas, algumas com satisfação, outras com alguma preocupação e tristeza, mas que temos de aceitar em virtude de, como um disse Winston Churchill, “a democracia ser o pior dos regimes, à exceção de todos os outros.” Aqui ficam então, os aspetos mais relevantes da “minha” noite eleitoral:

1. Abstenção: Ultrapassou os 46%, é assustador ver que quase metade da população portuguesa está-se a “marimbar” para a democracia, desculpem-me o termo. Por mais que muitos partidos e muitos políticos “deixem muito a desejar”, não é a melhor forma de o manifestarmos. No Ensaio sobre a Lucidez, Saramago faz uma crítica mordaz ao poder político, quando num qualquer país mais de 70% da população vota em branco. E se por cá acontecesse algo parecido? Ficariam os políticos preocupados?

2. Chega: Se a abstenção não é a melhor forma de responder ao descontentamento com a política, votar em determinados partidos, daqueles em que o povo vota “só para chatear”, talvez também não seja melhor. O Chega obteve mais de 200 mil votos, elegeu 19 vereadores e ficou em 4.º lugar. Para um partido com pouco mais de 2 anos e com ideais que muitos consideram perigosos, pode ser assustador.

3. Santana Lopes: Vinte e quatro anos depois, Pedro Santana Lopes volta a vencer as eleições na Figueira da Foz e torna-se novamente Presidente de Câmara. Como independente, e contra todos os aparelhos partidários, Santana Lopes demonstrou o que é ser um político da velha guarda. Foi a minha primeira alegria da noite eleitoral.

4. Carlos Moedas: A minha segunda alegria da noite eleitoral foi a vitória de Carlos Moedas na capital. Este também, contra tudo e contra todos, venceu aquela que no fundo é Câmara mais importante do país. Carlos Moedas mostrou ao longo da campanha ser um político do qual não é difícil gostar, transpira simpatia, respeito e honestidade. Apesar de Fernando Medina ter assumido a derrota como “pessoal e intransmissível”, António Costa tem muita responsabilidade também. Andar pelo país a fazer da “bazuca” uma arma de campanha ficou-lhe mal, tentar passar a ideia de que com autarcas do PS seria mais fácil às autarquias aceder aos milhões da “bazuca” foi um truque baixo. Incompreensível para aquele que é, na minha e na de muitos comentadores, o mais hábil político do país.

5. Valença: O resultado de Valença deixou-me triste e feliz ao mesmo tempo. Depois do meu amigo Jorge Mendes ter deixado a Câmara para rumar à Assembleia da República, o PSD fragmentou-se, essa divisão levou a que o PS ganhasse as eleições. O movimento independente Fortalecer Valença, liderado por José Monte, integrava nas suas listas a Professora Catarina Domingues, que em tempos passou por Paredes de Coura, e com a qual tive o privilégio de trabalhar. Valença pode ter perdido uma excelente Vereadora da Educação, mas as crianças que a vão continuar a ter como Professora ganharam ainda mais!

6. O meu concelho: Fruto da minha mudança de residência, votei pela primeira vez no concelho de Alcochete. Ajudei o PS a obter a maioria na Câmara e na Junta de Freguesia do Samouco, e fiquei feliz por isso. Embora não me identifique muito com este atual PS, quando se trata de eleições locais o que importa são as pessoas, e é fácil perceber quando os executivos trabalham bem. E aqui, tive a sorte de ver obras, limpeza e bastante alcatrão durante todo o mandato, não como em muitas autarquias do país onde o alcatrão só aparece 6 meses antes das eleições. E quando é assim, é esse partido que merece o voto do povo.

7. Paredes de Coura: Esta foi daquelas alegrias que quase nem se festeja pois já se sabe que vai acontecer. Ainda assim fiquei admirado pois desta vez o PS não obteve a totalidade dos mandatos. Se calhar até é bom, ter algum tipo de oposição é muitas vezes um estímulo para se melhorar o trabalho. Apesar de estar longe, sigo com atenção o que se passa naquela que foi a minha terra durante 13 anos, e continua e vai continuar no meu coração. Continuo a achar que era muito bom que houvesse uns quantos “Vítor Paulos” pelo país fora. O PS tem muito a aprender com Paredes de Coura, e já teve tempo para isso.




Crónica publicada na edição 418 do Notícias de Coura, 5 de outubro de 2021.