segunda-feira, 19 de abril de 2021

Moçambique, Ronaldo e AstraZeneca

Finalmente começaram a matar estrangeiros em Moçambique.


Escrito assim parece uma falta de respeito, eu sei, o objetivo não é desrespeitar ninguém, é talvez apenas alertar para uma evidência demasiado triste e inadmissível, mas a verdade é que há vidas que valem bem mais que outras, e Moçambique é a prova viva (morta) disso. Desde 2017 que o país sofre com os ataques do grupo jihadista Estado Islâmico. O conflito armado no norte de Moçambique faz com que haja cerca de 700 mil pessoas deslocadas que fogem à morte, e haja quase 1 milhão de pessoas a enfrentar forme severa. A razão é simples, acho eu… a região é rica em pedras preciosas e é lá que se localiza um dos maiores investimentos de África para extração de gás natural. As notícias sempre existiram e já eram chocantes antes do último ataque em Palma. Já se ouviam relatos de imensas pessoas desaparecidas e de ruas cheias de corpos, por onde passava, o grupo terrorista semeava o terror e a morte. A diferença parece ser simples, no último ataque começaram a morrer estrangeiros, e talvez seja essa a sorte do povo de Moçambique. Nas últimas semanas já se começaram a ouvir as vozes de alguns dirigentes mundiais, inclusive do governo português que se mantinha vergonhosamente calado, nunca tendo assumido uma posição firme de condenação. António Guterres, Secretário-geral da Organização das Nações Unidas, alertou há dias para a necessidade de ajudar o país, e “pediu mais apoio internacional para Moçambique ultrapassar tripla ameaça, resultante da violência, das crises climáticas e da pandemia". Esteve bem, embora tardiamente. Quase me apetece aproveitar parte de uma rábula dos Gato Fedorento e escrever: “O que era preciso era que os Amaricanos amandassem para lá uma bomba.” Mas os Americanos têm mais apetência para ajudar povos de países ricos em petróleo…

Segundos antes do final do jogo Sérvia-Portugal, a contar para o apuramento para o Mundial, e numa altura em que o jogo estava empatado a duas bolas, Ronaldo marcou um golo, um jogador sérvio conseguiu tirar a bola de dentro da baliza e, vergonhosamente, o golo não foi assinalado. O árbitro principal até podia não ter visto, mas o fiscal de linha tinha a obrigação de ter visto a bola completamente dentro da baliza. Ronaldo revolta-se, reclama, leva cartão amarelo, atira a braçadeira ao chão e vai-se embora. Minutos depois já havia umas quantas “virgens ofendidas” a condenar o gesto. Haja paciência… digam-me lá qual seria a vossa reação… eu era bem capaz de atirar a braçadeira, e as chuteiras e a camisola e tudo o resto. Portugal tem na sua seleção o melhor do mundo, e por tudo o que já nos deu, e se calhar o que ainda nos vai dar, nem merece que se coloque a questão da desculpa. Desculpa pediu o árbitro depois pelo erro que cometeu, mas de nada vale, o que fica é o empate. Ironia das ironias, até os atos “irrefletidos” de Ronaldo são um exemplo. Dias depois a braçadeira apareceu num leilão de caráter humanitário, e rendeu cerca de 64 mil euros, quantia destinada a ajudar um bebé de seis meses que sofre de atrofia muscular.

Os Professores foram incluídos na primeira fase da vacinação contra a Covid-19. Acho bem porque sou Professor, acho bem porque é um grupo que lida com centenas de crianças diariamente, acho mal pois preferia ver vacinados os meus Pais em primeiro lugar. Depois de vacinados médicos, enfermeiros e bombeiros da primeira linha de combate à pandemia, seguir o critério da idade talvez fosse mais justo, e provavelmente mais aceite por todos. Mas adiante. Venha a vacina. E como alguém engraçado escreveu no facebook “Os professores tanto quiseram ter a vacina, que vão levar com a AstraZeneca. Bem feito!” Esta vacina tem estado sobre forte pressão, já foi suspensa por alguns países, inclusive durante uns dias em Portugal. São várias as notícias de que têm surgido casos de trombose após a vacinação. Foram identificados 30 casos de coágulos sanguíneos em 18,1 milhões de pessoas vacinadas. A percentagem é baixíssima, mas ainda assim, é natural sentir um certo receio. Qualquer um de nós pode fazer parte desses 30. Com receio ou não, quando receber o SMS obviamente que vou responder SIM. E lá vou, mesmo sabendo que tenho uma série de colegas professores que vieram de lá como se um “camião lhes tivesse passado por cima”. Pelos vistos, os sintomas são duros. É caso para alertar: Se a vacina faz isto, imagine-se o vírus.

Crónica publicada na edição 407 do Notícias de Coura, 13 de abril de 2021.