terça-feira, 28 de novembro de 2017

O jantar

Terminou há uns dias a Web Summit 2017. Paddy Cosgrave, mentor do evento, fez um balanço claramente positivo do evento, assinalando os mais de 59 mil assistentes de cerca de meia centena de países. Assinalou ainda a presença de 35% de mulheres na categoria de “bons speakers”. Para rematar, classificou de “muito interessantes” as delegações de Angola ou Moçambique. Num mundo que se quer pacífico e tolerante, é estranho continuar a existir esta necessidade de assinalar a percentagem de mulheres num evento, e de dar um elogio à presença de países mais “pobres”, normalmente do continente africano. Tirando estas, e outras tiradas, o evento foi um sucesso, consegue trazer milhares de pessoas ao nosso país, fica cá algum dinheiro (mais de 200 milhões segundo as previsões do Ministro da Economia), e dá uma enorme visibilidade ao país. Pena é o astronómico preço dos bilhetes… preços mínimos de 700 € para visitantes! Embora tenha sido lançada uma campanha para jovens com preços de 7,5€, este é um evento que definitivamente não é para todos, muito menos para os portugueses. 
O Web Summit acabou. De que é que se tem falado?! … Do jantar! 
Pois é. A organização do evento teve a “infeliz” ideia de alugar o Panteão Nacional para um jantar de gala. Desde 2014 que é possível alugar espaços públicos para eventos (e eu acho muito bem que o país saiba rentabilizar os seus monumentos, embora pense que alguns deviam estar de fora). Nesse despacho, aprovado pelo anterior governo, está bem explícito que “todas as actividades e eventos a desenvolver terão que respeitar o posicionamento associado ao prestígio histórico e cultural do espaço cedido". Perante isto, o primeiro-ministro António Costa considerou “absolutamente indigna a utilização do Panteão Nacional para um jantar inserido na Web Summit”. E tem razão. O que ele se parece esquecer, ou finge esquecer, é que alguém teve de dar autorização para esse jantar, e não me parece que neste aspeto possa apontar o dedo ao anterior governo. Entretanto, a diretora do Panteão já veio dizer que “a autorização para o jantar foi dada por quem tem que autorizar, ou seja, a Direção Geral do Património Cultural”. Ponto final. 
Isto de jantar no Panteão não é de agora. Pelos vistos, já em 2013 a Associação de Turismo de Lisboa lá realizou um evento do género, para dar visibilidade ao fado. Nessa altura, António Costa era o Presidente da Câmara de Lisboa e liderava por inerência a dita associação, mas não teve conhecimento. A mim parece-me que foi indigno realizarem um jantar e não convidarem o seu líder e presidente da autarquia. Mas eles lá sabem. 
Para terminar, o governo já garantiu que vai mudar a lei. Fazem muito bem. Façam-no depressa. Não vá alguém lembrar-se de alugar o Panteão para o Festival da Canção.

Crónica publicada na edição 329 do Notícias de Coura, 21 de novembro de 2017.