terça-feira, 28 de junho de 2016

Sim, Senhor Ministro

Nas últimas semanas a cor amarela ganhou destaque em muitos órgãos de comunicação social. É a cor do protesto escolhida pelos colégios com contratos de associação e que viram o despacho de abertura do ano letivo não lhes permitir abrir turmas de início de ciclo no próximo ano letivo. 
O que está em causa é muito simples e explica-se em meia dúzia de palavras. Quando a oferta pública de ensino não era suficiente para chegar a todos os alunos, foram estabelecidos contratos de associação com colégios, cooperativas de ensino e outras instituições, para dessa forma cumprir o dever constitucional do Estado de garantir a educação de todos os cidadãos. O Estado pagava anualmente uma verba de cerca de 80.500€ por turma para tal. Penso que será fácil perceber que, se há oferta pública do estado, não faz sentido pagar aos privados. Não me vou alongar a esmiuçar a legislação que regula toda esta problemática, deixo apenas algumas questões/considerações: 

1. Em Vila Nova de Famalicão existem 3 colégios financiados e 13 escolas públicas próximas. Vão ser poupados 4 milhões de euros. 

2. Em Braga, há 7 escolas públicas a menos de 10 km do Externato Infante D. Henrique. 

3. O Colégio Liceal de Santa Maria de Lamas, em Santa Maria da Feira, recebeu em 2015/2016, 6 milhões de euros, apesar de existirem à sua volta 14 escolas públicas com os mesmos níveis de ensino. 

4. Em Vila Praia de Âncora, a escola pública e a escola privada ficam na mesma rua, uma de cada lado. Neste caso nem é argumento falar-se em liberdade de escolha, porque depois de terminarem o 2.º ciclo, os alunos são obrigados a deixar a escola pública. 

5. Há até neste país um colégio, financiado, com 27 estabelecimentos públicos a menos de 10 km. (Como disse e bem a Secretária de Estado da Educação, há casos em que o Estado está a “sustentar os privados”, e isso tem que acabar.) 

6. Os professores destas escolas estão preocupados com o desemprego que o fecho de turmas vai causar. Perdoem-me colegas, mas muitos de vocês estão a trabalhar nos colégios por opção, nunca quiseram submeter-se a um concurso nacional de professores que vos poderia colocar a trabalhar longe de casa. Digam-me como foram recrutados, foi por concurso nacional e transparente como os professores do público? Onde estavam os vossos gritos de igualdade e revolta nos últimos anos, quando mais de 30000 professores do público ficaram fora do sistema? 

7. As manifestações “amarelas” são sem sombra de dúvida organizadas e promovidas por grupos económicos que estão prestes a perder um filão de dinheiro fácil. Basta ouvir as declarações de muitos dos entrevistados, alguns momentos farão parte decerto dos melhores apanhados da televisão. No congresso do Partido Socialista pudemos assistir a uma manifestação, segundo os próprios, “espontânea”, com cartazes todos idênticos, o mesmo grafismo, o mesmo tamanho e as mesmas palavras de ordem. 

Enfim, muito mais haveria para dizer, vou deixar outras considerações para quem sabe, outra crónica. Não está em causa a existência dos colégios, nem sequer a qualidade do ensino que ministram. Trata-se simplesmente da seriedade na gestão dos dinheiros públicos. Por isso, o título desta crónica, Sim, Senhor Ministro, nesta temática louvo-lhe a audácia da tomada de decisão. Na verdade, trata-se apenas de cumprir a lei, mas os seus antecessores nunca tiveram a coragem de o fazer, e por isso, estas palavras de apreço.* 

* Como professor, não posso deixar de escrever sobre as temáticas que rodeiam a minha profissão. Como “Courense há já 10 anos”, sinto que escrever sobre educação pode ver associada a questão política, pois Tiago Brandão Rodrigues, Ministro da Educação, é um filho da terra. Como já algumas vezes aqui o disse, escrevo totalmente liberto de tonalidades partidárias, e ainda tenho guardada uma crónica em que pretendo falar da abolição dos exames, com a qual não concordei, embora me tenha livrado de muito trabalho, o que nesta altura do ano dá imenso jeito.




Crónica publicada na edição 297 do Notícias de Coura, 21 de junho de 2016.