segunda-feira, 20 de junho de 2022

A América.

No passado dia vinte e quatro de maio, um jovem de dezoito anos entrou armado numa escola do Texas e matou dezanove alunos e dois professores. Desde 2013, foram mais de cinquenta os massacres em escolas dos Estados Unidos.

Na América, aquela que tantas vezes é chamada da “terra das oportunidades” é mais fácil comprar uma arma do que adotar um animal de estimação, basta ter 18 anos e ir a uma loja. Muitos destes atacantes são depois abatidos pela polícia ou cometem suicídio. Nada que repare os danos que fazem em poucos minutos e que prolongam para a eternidade em dezenas de famílias. Surgem depois as tentativas de explicar as razões: jovens problemáticos que sofreram abusos, famílias mal estruturadas, situações de bullying. Comum é o facto de serem tipicamente indivíduos desequilibrados do ponto de vista mental e que, e aqui está na minha opinião o fator decisivo, terem a oportunidade, ou seja, têm acesso fácil a armas de fogo.

No Texas, qualquer pessoa pode comprar uma arma a partir dos dezoito anos, basta apresentar o documento de identificação para verificar se o cadastro está limpo, preencher um formulário, escolher a arma e pagar. Tão simples quanto ir comprar um maço de cigarros. Na via pública, a partir dos 21 anos, qualquer cidadão pode carregar consigo uma arma de fogo, sem qualquer tipo de restrição ou licença necessária.

Muitos países têm pessoas com desequilíbrios e problemas mentais, mas estes tiroteios só acontecem com frequência nos Estados Unidos. Porquê? Perguntou indignado o Presidente dos Estados Unidos Joe Biden, acrescentado: “Por amor de Deus, quando vamos enfrentar o lobby das armas?”

A resposta pode muto bem ser dada pelos acontecimentos posteriores ao massacre. No fim-de-semana seguinte ao dia do ataque, realizou-se a convenção anual da National Rifle Association, entidade que há mais de um século defende o direito dos cidadãos dos Estados Unidos à posse e porte de armas de fogo. Haverá melhor exemplo da força do lobby? Vários membros desta entidade são políticos influentes, o que justifica a razão do Congresso não conseguir aprovar leis para controlar as armas. Neste evento, discursaram o Governador e o Senador do Texas e, o ex-Presidente Donald Trump. Ninguém esperaria nada diferente, Trump defendeu o fim da proibição de armas em zonas escolares, acrescentado que todas as escolas deviam ter uma só entrada, cercas fortes, detetores de metal e um guarda armado à porta. Já em tempos ele defendeu que cada professor devia ser portador de uma arma.

Voltando ao massacre e ao jovem assassino, soube-se mais tarde que já tinha utilizado as redes sociais para dizer que iria realizar tiroteios e violar raparigas. Não foi levado a sério. Apesar das ameaças e das denúncias, o perfil do jovem nunca foi fechado nem sequer as autoridades informadas. Falhou o algoritmo. A mim, o Facebook já me bloqueou por ter usado a palavra “maricas” numa crítica que fiz aos líderes europeus pela falta de coragem em enfrentar Putin. Para piorar tudo isto, falharam também as autoridades policiais que demoraram mais de uma hora a entrar na escola.

Quando é que tudo isto acabará? Nunca. É um trágico exemplo do que é um lobby e da força dos interesses económicos. A América. A tão badalada terra das oportunidades é a terra onde só se pode beber álcool aos vinte e um anos, mas pode-se comprar uma arma aos dezoito. A América, a terra onde tantos Pais vão levar os filhos à escola, e vão mais tarde buscar um cadáver. A América, uma terra que em tempos desejei conhecer, mas que cada vez menos me encanta.

Crónica publicada na edição 434 do Notícias de Coura, 07 de junho de 2022.



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