terça-feira, 17 de junho de 2025

Continência.

Quebrou-se finalmente o tabu das próximas eleições presidenciais, Gouveia e Melo vai ser Presidente… perdão, candidato à Presidência da República.

Escrevi em tempos numa crónica que o Sr. Almirante não se devia meter na política, que o que tinha feito pelos portugueses durante a pandemia era suficiente para que o povo lhe reconheça o valor e lhe esteja agradecido, mas nos últimos tempos mudei de opinião. Também eu me comecei a fartar dos políticos de carreira, dos seus discursos vazios de conteúdo e cheios de ódio e desconsideração pelos seus adversários, desta vez também o meu será um voto contra o sistema. (Só mesmo António Guterres me faria mudar de opinião.) Estou aborrecido com o sistema, mas não a ponto de me tornar eleitor do Chega, se um dia isso estiver prestes a acontecer, faço das palavras do Almirante as minhas: “Se isso acontecer, dêem-me uma corda para me enforcar.” Pior do que estar aborrecido com os políticos, é ver que os que se perfilam na corrida a Belém não darem entusiasmo nem mereçam a confiança do meu voto. Marques Mendes nunca foi político que me gerasse simpatia, e o comentário político semanal em nada mudou esse sentimento. Embora tendo o apoio do seu partido, Marques Mendes nem dentro do PSD é admirado, não terá votação digna de registo. (E que reze para que Ventura não seja candidato, teria quase de certeza pior resultado!) Do lado do PS, o passado repete-se mais uma vez, o orgulho das várias fações do partido é maior e não permite um candidato único. Foi assim que colocaram Cavaco em Belém durante dez anos, quando não se uniram em torno de Manuel Alegre. António José Seguro vai ser candidato para chatear parte do partido, António Vitorino é o nome de quem se fala sempre que as presidenciais se aproximam, e até o nome de Sampaio da Nóvoa volta a ser ouvido. Mesmo que o PS não se dividisse, desta vez dificilmente mudaria o rumo dos acontecimentos.

Gouveia e Melo tem razão quando fala numa “reação corporativa”, os políticos de carreira estão zangados, desdobram-se em críticas e em explicações de que alguém sem experiência política não deve ser Presidente da República, que não estará preparado para responder aos desafios políticos cada vez mais complexos do regime. Aquilo que me parece é que estão a dar um mau exemplo do respeito que deviam ter pela democracia, e acima de tudo estão preocupados pois vão-se fechar uma série de cargos e portas políticas que estão habituados a ter há muitos anos. Marcelo Rebelo de Sousa foi um Presidente lançado pelo comentário político, Marques Mendes preparava-se para ser o seguinte, não fosse a Pandemia ter aparecido e ser necessário vir um militar colocar ordem na casa, pois como se lembram, os nomeados politicamente deram péssimos exemplos de gestão, ética e respeito pelo cargo. Gouveia e Melo diz estar a responder ao pedido que vê emergir no povo, apresenta-se quase como um D. Sebastião cujo povo anseia e espera ver resolver os seus problemas, necessidades e desejos. Obviamente que Gouveia e Melo se deslumbrou quando sentiu que o reconhecimento da população o podia colocar como o mais alto magistrado da nação. Quem não sentiria o mesmo? Quem desperdiçaria tal oportunidade? Ainda falta meio ano para as eleições presidenciais, ainda está por aparecer alguém do PCP, Tino de Rans é capaz de voltar a candidatar-se e pelo meio ainda teremos eleições autárquicas. Não me parece que as presidenciais tenham muito mais motivos de interesse e fico a torcer para que se despachem logo à primeira volta.

Ramalho Eanes afirmou em 1976 que “não era o candidato das forças armadas nem dos partidos” e que o seu compromisso “era com o povo português”. Em 2024 Ramalho Eanes foi avaliado como o Presidente com avaliação mais positiva, num barómetro da Intercampus. Talvez daqui a cinquenta anos aconteça algo parecido a Gouveia e Melo. E se isso acontecer, fica-se já com uma ideia dos Presidentes que se seguem! (Vou-me rir já, pois nessa altura já não é coisa que me preocupe!)



Crónica publicada na edição 503 do Notícias de Coura, 10 de junho de 2025



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