terça-feira, 31 de outubro de 2023

Ambientalistas precisam-se, mas deste tipo não.

A Organização das Nações Unidas alertou há algumas semanas para o facto de um grande número de países em desenvolvimento terem aumentado as emissões de gases poluentes nos últimos três anos. Esta estratégia de recuperação económica associada ao aumento da produção não esteve associada à melhoria das condições de vida da população, e pior, os níveis de pobreza aumentaram na maioria destes países. Os países mais poluidores continuam a ser sem surpresa, os Estados Unidos da América, a China e a Índia. Portugal tem vindo a melhorar, embora timidamente. Em vários relatórios e rankings que consultei, encontrei a Dinamarca como o melhor país para viver.

Os leitores do Notícias de Coura estarão a perguntar-se nesta altura porque diabo estou a escrever sobre problemas ambientais. Não se trata apenas da necessidade de escrever sobre alguma coisa, mas de não poder deixar de registar a minha indignação sobre as ações que alguns jovens idiotas (apetece-me chamar-lhe marginais mas não vale a pena), têm feito nos últimos dias tendo como pretexto a defesa do ambiente e a condenação das empresas poluidoras.

Começaram por, numa conferência organizada pela CNN Portugal sobre o tema da energia verde, lançar tinta verde sobre o Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro. Justificaram a ação pelo facto de o governante estar num evento patrocinado pela EDP e pela Galp. O Sr. Ministro manteve-se calmo e sereno e decidiu não apresentar queixa. A meu ver fez mal, apenas contribuiu para que se acentue o clima de impunidade que muitos jovens sabem que se vive no nosso país. Ações destas têm de ter consequências. Ainda gostava que alguém perguntasse a estes jovens se lá em casa são clientes da EDP ou da Galp, ou se ainda se iluminam à luz de vela e andam todos de bicicleta.

Alguns dias depois, dois ativistas ambientais atiraram tinta vermelha sobre um quadro de Picasso no Museu de Arte Contemporânea do Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Felizmente, a obra não sofreu danos porque estava totalmente protegida com um acrílico. Justificaram a ação afirmando que “não há arte num planeta morto”. Neste argumento têm obviamente razão, aliás, num planeta morto não haverá arte nem qualquer outra coisa. Ao mesmo tempo um dos ativistas afirmou que “as ações do grupo são pacíficas, apenas pretendem chamar a atenção para que o planeta não continue a ser danificado”. Parvoíce, digo eu. Não se combatem estes problemas danificando seja o que for ou atacando seja quem for, pelo menos desta forma absurda. E a prova é aquilo que seis outros jovens portugueses fizeram ao acusar 32 países por inação climática no Tribunal Europeu. Suportados por cerca de 20 advogados da Global Legal Action Network, os jovens apresentaram uma queixa alegando que os países visados violaram os direitos humanos ao não tomarem medidas em matéria de alterações climáticas, exigindo-lhes uma redução de 65% das emissões poluentes até 2030. Estes jovens merecem um aplauso, os outros não. Li algures uma coisa engraçada numa rede social: “Se olharem para as sapatilhas de um destes jovens que atacou com tinta o quadro de Picasso, conseguem ver umas Adidas, que custam mais de 100€, sapatilhas que são fabricadas no Bangladesh com um custo aproximado de 1€, por crianças que ganham cerca de 10€ por mês.” Eu era capaz de apostar que às tantas, estes jovens foram capazes de ter sido deixados à porta do Museu pelo BMW a gasolina do Avô e de terem registado a sua façanha no seu iPhone 15, enquanto vestiam roupas de alguma dessas marcas normalmente associadas à exploração de trabalho infantil, mas não o vou fazer, eu não percebo quase nada de roupa.

Entretanto, outros jovens ambientalistas têm mostrado a sua indignação cortando estradas, interferindo dessa forma com quem anda a trabalhar, ou tem simplesmente o direito de circular nas mesmas. Um dia destes alguém se vai aleijar.

Ambientalistas precisam-se e há uma coisa que todos podem começar por fazer. Há coisas bem simples que estão ao alcance de todos. Eu já o faço há alguns anos, e embora more num prédio com mais apartamentos e não seja minha obrigação, à minha porta eu limpo, é do meu interesse e contribui para o meu bem-estar. “Se cada um limpar à porta de sua casa, não é preciso estarem à espera que seja a junta ou a câmara a fazê-lo” *. Se cada um de nós o fizesse, o país e o mundo estavam bem melhores.



* Eu penso ter ouvido este desabafo de um Presidente de Câmara que vocês bem conhecem, mas não tenho a certeza. Mas se o não disse, podia muito bem tê-lo dito.



Crónica publicada na edição 465 do Notícias de Coura, 24 de outubro de 2023




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