segunda-feira, 17 de abril de 2023

IVA a 0, habitação a 1000.

Pressionado pela oposição e por uma insatisfação popular de que não há memória, o governo decidiu tomar algumas medidas de apoio às difíceis condições de vida que cada vez mais portugueses enfrentam. Algumas famílias vão receber mais alguns apoios sociais sob a forma de subsídios, dinheiro vivo para gastar. Só por aqui a coisa não funciona, as consumidores terão mais dinheiro, quem vende terá a tentação de subir os preços ou, na pior das hipóteses, de os manter. Nunca os irá baixar. Os funcionários públicos terão um aumento de 1% e o subsídio de alimentação subirá para 6€/dia. (Sobre estas medidas não me pronuncio pois sou parte diretamente interessada, e já não tenho paciência para as queixas dos Professores.) A diminuição da taxa do IVA para 0% num cabaz de produtos considerados essenciais é que parece ser a medida mais impactante, mas também não acredito que venha a ter efeitos significativos. Bens com taxa de IVA de 6% passarem a ter 0% significa que por exemplo uma carcaça que eu compro a 0,22€ passará a custar 0,21€ aproximadamente. Se eu comer 5 carcaças por dia vou poupar no mês 1,5€. É pouco certamente, mas associado a outros bens alimentares até sou capaz de poupar 20€ por mês. Até outubro pode significar uma poupança de 120€. Muito bom, melhor que nada. Se isto fosse acontecer seriam boas notícias, mas obviamente que não vai. Aliás, dois ou três dias depois do anúncio desta medida já havia produtos mais caros alguns cêntimos, ainda até sem se saber quais seriam os produtos abrangidos. O Governo diz ter feito um “acordo de cavalheiros” com os revendedores para que esta baixa de preços chegasse efetivamente aos consumidores, e até diz que vai contratar uma empresa privada para fiscalizar. Não acredito. Daqui a 2 meses vou perder uns minutos a comparar alguns talões de compras e analisar a diferença entre alguns produtos. Já imagino bem os resultados que vou obter.

Se nos bens essenciais a taxa de IVA caminha para zero, já na habitação aprece caminhar para mil. Há milhares de portugueses com créditos à habitação que viram as suas prestações mensais subir 100€, 200€ e quem sabe mais. Há o risco de em 2024 as instituições bancárias ficarem com milhares de casas em carteira por falta de pagamento das prestações. Quem não perde esta oportunidade são os chamados “proprietários”, um grupo de investidores individuais que vende e aluga casas a preços proibitivos (há até quem lhes chame pornográficos). Vale tudo, aqui perto da minha residência, apartamentos que se compravam a 80 ou 90 mil euros há 3 anos, estão agora a 150 ou 160 mil euros. Apartamentos novos entre os 200 e os 300 mil são quase todos vendidos ainda antes das obras começaram. E se formos falar em arrendamentos, a exploração atinge níveis completamente absurdos, fruto da falta de oferta e da enorme procura, especialmente das dezenas de imigrantes que chegam ao nosso país. Mas sobre isto nem vale a pena escrever mais nada. A manifestação do passado fim-de-semana em Lisboa foi elucidativa da crise imobiliária que o país atravessa e das dificuldades que atravessam todos quantos têm de arranjar casa.

Dizem que é a bolha imobiliária, um fenómeno causado pelo aumento indiscriminado dos preços durante um certo período, seguido de uma desvalorização. A mim parece-me que esta bolha está a encher demais, quando rebentar vai ser caso para dizer “Ca p#t@ de estouro!”, expressão protagonizada pelo Zeca Estacionâncio no filme sete pecados rurais, depois de morrer num acidente de mota e ter chegado ao céu.

Crónica publicada na edição 453 do Notícias de Coura, 11 de abril de 2023.



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