Barracas: Ainda me lembro de chegar a Lisboa de carro no início da década de noventa e ver centenas de barracas à entrada da capital. Lembro-me de achar curioso ver estacionados alguns Mercedes e Volvos à porta e de ver muitas antenas parabólicas, como era uma criança ficava na inocência não fazendo naturalmente segundas leituras. No final dessa década, João Soares prometeu acabar com as barracas e, mal ou bem, foram demolidos os principais bairros de barracas da cidade. Desde essa altura, não me lembro da televisão portuguesa se ter dedicado ao tema como o fez nos últimos dias a propósito da demolição de barracas em Loures. Quando vi as primeiras notícias fiquei triste, não se devia demolir aquelas barracas, que para muitas daquelas pessoas eram o seu único lar, o único teto para se abrigarem, o único espaço para guardarem os seus poucos pertences. Mas é importante ouvir todas as partes, pelos vistos, a muitas daquelas pessoas foram oferecidas alternativas que não foram aceites, algumas das pessoas indignadas são os artistas que comercializam as barracas a dois ou três mil euros, e é preciso também ter respeito pelos vizinhos que têm lá perto casas devidamente legalizadas, e a quem a luz é desviada, ficando sem um serviço pelo qual pagam. Como disse um dia Jaime Pacheco, um dos mais divertidos treinadores de futebol portugueses, “Isto é uma faca de dois legumes!” O que não faz sentido, é em 2025 existirem barracas, num país onde poderiam estar a entrar quarenta milhões de euros por dia provenientes do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência). Com o dinheiro de uma semana, faziam-se casas para 3000 famílias, (como disse um dia António Guterres: “É fazer as contas.”)
Cidadania: De um dia para o outro, anda meio país indignado com a alteração de algumas aprendizagens da disciplina de Cidadania. Como se a mesma representasse um perigo para a formação das crianças, ou como se de repente, como já ouvi um “pateta” de um comentador dizer, “a gravidez na adolescência vai voltar a números preocupantes!” Haja paciência! Obviamente que se trata de uma questão ideológica, o governo teve de ceder a uma certa direita conservadora e puritana e fez uma limpeza a algumas das palavras, quais pecados perversos e perigosos! Abordar com as crianças o respeito nas relações interpessoais, no namoro, na não discriminação sexual, religiosa ou racial, o problema da violência doméstica, são tudo temas que os professores sempre souberam abordar, independentemente daquilo que está escrito nos papéis e nas orientações. E vão continuar a fazê-lo, bem.
Centeno: Mário Centeno não foi reconduzido como Governador do Banco de Portugal. A meu ver, bem. Não está em causa a sua competência técnica, mas obviamente o seu perfil político. Mesmo sendo um cargo de nomeação política, é importante que o governador tenha a isenção suficiente para o desempenhar, coisa que manifestamente não tem. Saiu do Governo diretamente para o cargo, e já no cargo, ponderou ser candidato a Presidente da República e, pior, mostrou-se disponível para substituir António Costa quando este se demitiu do governo. Agora que está livre, espero que não pondere ser candidato à Presidência da República e venha a agradar à parte do Partido Socialista que não quer apoiar António José Seguro.
João Félix: No dia em que a novela Gyökeres acabou, e quando as televisões tinham os seus comentadores embrenhados na novela João Félix, eis que entram em cena Cristiano Ronaldo e Jorge Jesus. Ao que parece, dois telefonemas bastaram para que o desejo de Félix de voltar ao Benfica se tenha esfumado. Foi um golpe duro nas ações de campanha que Rui Costa tem vindo a concretizar, mas não se deve fazer passar o jogador por mercenário ou traidor. João Félix talvez já tenha percebido que passou ao lado de uma carreira fenomenal de jogador, está na hora de garantir o seu futuro e da sua família para o resto da vida. Quem não o faria!? Até eu, que adoro ser Professor, era capaz de ir para as Arábias vender pastéis de nata se me acenassem com dois ou três milhões por ano. (Provavelmente até não ia, o médico mandou-me cortar com os bolos!)
Termina mais uma crónica dedicada a vários temas, vamos ver se as férias me fazem voltar com força e inspiração para escrever um texto inteiro sobre um só tema. Boas férias e bom festival!
Crónica publicada na edição 507 do Notícias de Coura, 5 de agosto de 2025
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