terça-feira, 16 de maio de 2023

O 25 de abril fez-se também para isto

Nunca fui apologista de que não devemos trabalhar nos feriados ou aos domingos. Se há trabalho que precisa ser feito, e alguma vontade, faça-se. Da mesma forma defendo que devemos descansar ou dormir quando nos apetece, desde que isso não ponha em causa a nossa segurança e o cumprimentos dos nossos deveres profissionais. Pensei em escrever este texto na sexta-feira (28/04), ficava logo despachado e libertava-me da obrigação no fim-de-semana. Depois pensei que talvez fosse melhor esperar, os casos e casinhos continuam a fazer parte da agenda política e, se esperasse, talvez viesse por aí alguma bomba. Acabei por esperar, mas pela simples razão de me ter deitado no sofá e ter dormido toda a tarde. Chegou assim o feriado (1 de maio, Dia do Trabalhador) e, como trabalhador exemplar, vou cumprir a minha tarefa.

A última semana foi marcada por alguns acontecimentos políticos dignos de filme, trapalhadas e mentiras que nem sei se dariam um filme cómico, se dariam uma novela. Descobriu-se que afinal não existia papel nenhum. O parecer que supostamente servia de alicerce jurídico para a demissão da CEO e do Chairman da TAP, não existia. O tal papel foi invocado aquando da demissão dos mesmos em conferência de imprensa, existia quando foi pedido pela Comissão Parlamentar de Inquérito, mas a sua entrega negada pelo Governo alegando a “defesa do interesse público”, só quando os deputados ameaçaram com uma queixa à Procuradoria-Geral da República é que se fez luz. Afinal, não há papel nenhum. Mais engraçado ainda é, descobrir-se também agora que o Governo só recorreu ao apoio jurídico do Estado no dia seguinte ao da demissão da CEO da TAP. (O Governo deixou-se influenciar um bocadinho pela disciplina militar da convivência com o Vice-Almirante Gouveia e Melo, primeiro cumpre-se a missão, e depois logo se vê!) Para completar o ramalhete, Mariana Vieira da Silva veio afirmar que toda esta polémica é uma “questão de semântica”. Senhora Ministra da Presidência: - Não faça de nós estúpidos, argumentos deste tipo são ofensivos do respeito que o povo merece. Lembre-se do cargo que ocupa. Não queira envergonhar as Instituições, como sempre fazem questão de apontar a outros à sua direita.

Se a coisa tem ficado por aqui, o governo tinha tido uma semana positiva, com a inflação a baixar (embora estranhamente os preços estejam iguais!) e o PIB a registar valores dignos de alguma esperança, mas, eis senão quando, regressa ao país João Galamba. Demite o seu adjunto alegando que o mesmo não queria partilhar as notas da reunião entre deputados do PS e a CEO da TAP, aquela reunião em que supostamente se prepararam as perguntas e respostas que iam ser dadas na Comissão Parlamentar de Inquérito. Zangado pela demissão, acusando de ser João Galamba quem não queria que as notas fossem divulgadas, Frederico Pinheiro desloca-se ao Ministério e rouba o computador, atira uma bicicleta contra um vidro, obriga as funcionárias a esconderem-se na casa-de-banho e tem de chamar a polícia pois alguém lhe fechou as portas do Ministério! No dia seguinte, agentes secretos do SIS, Serviço de Informações e Segurança, foram incumbidos da missão de recuperar o computador, missão que cumpriram com sucesso e relativa facilidade. Daria vontade de rir se tudo isto fosse entre pessoas como nós, gente do povo. Mas isto passa-se com a gente que nos governa, com aqueles que tomam decisões, com aqueles que, de uma forma mais ou menos direta, traçam o futuro do país e do povo. É demasiado mau para ser tolerado. E para descer os últimos degraus na escada da dignidade política, não posso deixar de fazer referência à triste figura dos deputados do Chega na Assembleia da República na receção ao Presidente Lula da Silva e da tão, ou mais triste figura, do Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, na mesma sessão, e nos comentários e piadas proferidas cá fora na presença do Presidente da República, e que para grande azar dos mesmos, foram filmadas e transmitidas em direto. Santos Silva e Marcelo Rebelo de Sousa pareciam dois amigos, no café da aldeia, a mandar piadas e a rir sobre os vizinhos pelos quais não tem respeito nem consideração. Quando os mais altos magistrados da nação se prestam a isto, já não é de admirar que a democracia esteja como está. Afinal a revolução de abril fez-se para que tudo, ou quase tudo, se pudesse fazer e dizer.


Crónica publicada na edição 455 do Notícias de Coura, 9 de maio de 2023.



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