segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Vou viajar, mas só levo bagagem de mão!

Não podia de forma nenhuma deixar passar a oportunidade de escrever sobre isto!

Deputado do Chega na Assembleia da República suspeito de roubar malas nos Aeroportos de Lisboa e Ponta Delgada. Usando uma expressão popular que desde há décadas conheço: “Isto não lembrava nem ao diabo!” Por mais motivos que se tentem encontrar é difícil descobrir razões para uma “proeza”* desta magnitude. Um deputado tem um vencimento bem generoso, recebe também ajudas de custo que fazem inveja a milhares de trabalhadores do país, não tinha necessidade de roubar malas para depois vender a roupa a preços simbólicos numa plataforma online. (E sobre a roupa nem me vou pronunciar sobre o facto de, ao que se suspeita, não ser vendida a roupa de criança. Espero que o caso não fique ainda mais tenebroso.) O local onde o decidiu fazer é prova suficiente para ter uma ideia da inteligência do artista! Haverá lugar mais vigiado que um aeroporto!? André Ventura deve ter ficado fora de si, ao menos teve a decência de o condenar e até pelos vistos de o pressionar a deixar a Assembleia da República. (Dizem as más-línguas que os deputados do Chega o chegaram a apertar fisicamente, deviam ter sido mais brutos, talvez resultasse. Eu não os condenaria!) Mal esteve o líder do Chega Açores, ao vir com a conversa sobre da “presunção de inocência” e “deixar à justiça o que é da justiça” ou “agora é o tempo da justiça”, fez lembrar os políticos dos grandes partidos quando têm chatices destas com os seus camaradas. Entretanto, o Sr. Deputado Miguel Arruda diz que vai meter baixa psiquiátrica, e depois volta como deputado independente, com gabinete próprio e mais de cinco mil euros por mês para despesas. Ficará bem melhor. Espero que os seus vizinhos façam alguma coisa para que o nome da sua terra não continue nas notícias por maus motivos.

Já que viajei até aos Açores, e não corro o risco da minha mala desaparecer, pois só levo bagagem de mão, vou dar um saltinho ali a Washington D.C. e dar uma ajuda ao Presidente Trump. Vi nas notícias uma imagem de Donald Trump, sentado à sua secretária da Casa Branca a assinar dezenas de despachos, em capas pretas de tamanho A4. Não havia necessidade de ser em papel, além de ser um gasto desnecessário, e “matar” imensas árvores, dá uma imagem de desorganização e atraso tecnológico. Nem sei como Elon Musk ainda não reparou nisto. Levo comigo o meu portátil e um leitor de cartões de cidadão, espero que eles me deixem usar a internet para lhes mostrar o que é a assinatura digital e a forma segura de assinar documentos online. (Peço a algum emigrante que eventualmente passe junto à Casa Branca, para meter uma fotocópia do meu artigo na caixa de correio!) Agora mais a sério, que o homem era louco já todos sabíamos, mas nunca pensei que todos os dias fizesse da loucura, lei: deportar imigrantes ilegais compreendo, agora que viajem de pés e mãos atados é desumano; que ajuste as tarifas dos produtos chineses percebo, agora fazê-lo ao Canadá é uma péssima ideia, país do qual depende em termos energéticos. Já nem vou falar da ideia absurda de querer anexar Canadá e Gronelândia. Há que fazer frente a este homem, só quando sofrer na pele as consequências das suas decisões é que o povo americano vai perceber a asneira que fez, não sei se não será tarde demais.

Para que esta crónica não seja só falar de “gente louca”, não posso falar desta vez dos candidatos presidenciais! Termino a crónica salientando a coragem do líder do PS, Pedro Nuno Santos, em reconhecer a necessidade de o país não ter as portas abertas sem criar condições dignas para quem vem trabalhar para Portugal. Controlar as fronteiras é lutar contra o tráfico e a exploração de mão-de-obra que existe no nosso país, e não é uma perceção, é um facto. Já na parte de assumirem a nossa cultura e os nossos hábitos, esteve mal. O que todos têm obrigação é de respeitar e cumprir as nossas leis.



* Uso o termo proeza não no sentido mais conhecido da palavra, ser um ato de valor ou uma façanha, mas por ser a expressão que a minha esposa usa quando eu faço alguma daquelas coisas que também não lembram ao diabo!


Crónica publicada na edição 495 do Notícias de Coura, 11 de fevereiro de 2025



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

E se correr mal?

Anunciei na última crónica dedicar esta aos meu desejos para 2025, mas como os meus desejos nem sequer a mim interessam muito, vou deixar aqui alguns assuntos que me inquietam, a mim e ao mundo, e que podem mesmo correr mal.

Rúben Amorim: Não podia deixar de começar por aquele que ajudou a dar título a esta crónica. Quando foi de Braga para o Sporting por dez milhões de euros, alguém o questionou como se justificaria tamanho investimento se o mesmo viesse a correr mal. Amorim respondeu: - E se corre bem!? E correu bem, aliás muito bem. Quando se confirmou que iria treinar o Manchester United pensei: - E se corre mal? Obviamente que hoje é fácil perceber que está a ser difícil, ainda assim, acredito que vai correr bem. Acredito tanto que irei apostar alguns euros no United como vencedor do próximo campeonato em Inglaterra.

Donald Trump: Está prestes a tomar posse, diz-se o mundo aguarda com alguma expetativa, mas eu quero acreditar que é mais medo do que outra coisa. Trump garantia há alguns meses que iria terminar com a guerra na Ucrânia com um telefonema. Já percebeu que nem com um telefonema, nem com meia-dúzia, acredito que Putin até aceitasse algum tipo de cessar-fogo, desde que ficasse com os territórios entretanto conquistados, e com a garantia que a Ucrânia não aderisse à NATO, mas Zelensky jamais aceitará. Além desta guerra, Donald Trump fala em anexar o Canadá e em tomar posse da Gronelândia e do Canal do Panamá. Quando ouvi isto pensei: - Enlouqueceu de vez. Mas se calhar, Trump percebeu que a Gronelândia está a descongelar e é rica em minerais e até em petróleo, além disso, com o descongelamento podem-se abrir rotas árticas que seriam vantajosas para as exportações de produtos americanos para a Ásia e a Europa; anexar o Canadá traria benefícios económicos significativos às contas dos EUA; controlar o Canal do Panamá limitaria a circulação de navios, tentando dessa forma combater o sucesso do mercado Chinês pelo mundo. Mesmo quando tudo isto é justificado por razões de segurança interna, são as questões económicas verdadeiramente interessam. Este segundo mandato de Donald Trump tem tudo para correr mal, ainda mais quando tem como assessor Elon Musk, um louco viciado em trabalho. Era bom que pusesse a sua incrível capacidade empreendedora ao serviço do bem.

Gouveia e Melo: A mais do que previsível candidatura do Vice Almirante Gouveia e Melo não é coisa que pessoalmente me preocupe. Reconheço-lhe o mérito de ter colocado ordem na campanha de vacinação contra o Covid-19 e de ter acabado com as “vigarices” típicas que sempre têm lugar neste nosso Portugal. A sua possível candidatura está a correr mal para os partidos, pois estão a ficar com a noção que vão perder influência, pois dificilmente um militar lhes vai deixar “meter o nariz” onde não devem. Mas o pior para os partidos é verificarem que não têm nenhum candidato à altura de lhe fazer frente, já perceberam que os portugueses acreditam cada vez menos nos políticos de carreira. Da parte do PSD já se imagina que será Marques Mendes, do PS só ainda não se sabe quantos candidatos serão (mais uma vez, o PS vai-se anular internamente), do Chega não poderia ser outro que não André Ventura (a ver se tem uma votação que o faça descer do pedestal), dos outros partidos, sejam quem eles forem, é apenas para fazer ruído. Para os partidos do sistema vai certamente correr mal, para Gouveia e Melo, correr mal significa ter de ir a uma segunda volta.

As certezas do costume: Ao jeito de alguns dos melhores “bruxos” conhecidos, também eu me debrucei sobre a minha bola de cristal e consegui prever algumas das coisas que vão acontecer em 2025: vamos ter algumas catástrofes naturais pelo mundo, incêndios, derrocadas e inundações vão afetar muitos milhares de pessoas; as alterações climáticas não vão abrandar, o gelo vai continuar a derreter e a temperatura média a subir; em Portugal, tal como no mundo, vão morrer alguns artistas e personalidades muito conhecidas; o discurso político em Portugal vai continuar picante, cada vez mais ofensivo e com muito pouco conteúdo; eu sou capaz de continuar a ter alguns problemas em arranjar assunto para escrever as minhas crónicas para o Notícias de Coura. (Mas neste particular, não irá correr mal!)

Bom ano de 2025 a todos os leitores!

Crónica publicada na edição 494 do Notícias de Coura, 28 de janeiro de 2025





domingo, 19 de janeiro de 2025

200!

Esta é uma crónica há muito preparada! Quando em setembro de 2020 escrevi a crónica número 100, prometi só voltar a lembrar alguns dos meus textos quando chegasse à número 200! Cá estamos. Quem diria que chegaria tão longe quando em 2012 o Tinoco me convidou a escrever para o Notícias de Coura. Tem sido uma responsabilidade, mas acima de tudo um prazer! Vamos lá então passar em revista as últimas 99 crónicas!

2020: Deste ano saliento duas crónicas, a do mês de novembro quando Donald Trump perdeu as eleições presidenciais americanas. Admirava-me eu na altura de ele ter tido quase 70 milhões de votos, quatro anos depois teve quase 80 milhões, e foi novamente eleito Presidente. Em dezembro fiz um tributo ao “Paredes de Coura Terra Amada”, um grupo do Facebook com cerca de 16 mil membros. Hoje tem quase 22 mil e continua a espalhar a imagem de Coura pelo mundo.

2021: Comecei o ano com uma crónica de esperança, especialmente na vacina que nos poderia trazer de novo à normalidade e alegrei-me quando em maio, finalmente o “povo foi solto” e voltámos a ter muitas das liberdades suspensas pela Covid-19. Pouco mais me lembro deste ano, apenas de que em setembro quase falhei o prazo de envio da minha crónica para a redação do Notícias de Coura, culpando nessa altura os efeitos secundários da vacina Pfeizer!

2022: Em maio escrevi que tinha começado uma guerra que nos devia envergonhar. Já passaram mais de dois anos e meio, a Ucrânia está praticamente destruída e tanto o Ocidente como os EUA preparam-se para conversar com Putin. Vai voltar a acontecer como em 2014 depois da invasão da Crimeia, vão-lhe dar conversa e ficar de novo amiguinhos, daqui a meia dúzia de anos ele volta a atacar. Terminei o ano quase a falar sobre o caos que se vivia nas urgências da região de Lisboa, mas acabei a agradecer a Ronaldo tudo o que tinha feito por Portugal, depois de o ver abandonar o estádio sozinho e em lágrimas.

2023: Comecei o ano com o “Habituem-se” de António Costa, a sua expressão era a prova provada do seu caráter prepotente e teimoso, não imaginava ele, nem nós, que no final desse ano estaria a pedir a demissão. Pelo meio, fui escrevendo sobre a crise na habitação, as trapalhadas na TAP, o Benfica campeão e a vaga de calor na Europa. Terminaria o ano a escrever sobre a enorme barafunda em que o Dr. Nuno Rebelo de Sousa meteu o seu Pai, o Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República. Este caso parece ter ficado adormecido, mas já ninguém tem dúvidas que foram mexidos os cordelinhos certos para proporcionar uma consulta às duas crianças brasileiras.

2024: Como acontece quase todos os anos, foi em abril que me lamentei da falta de ideias e prometi escrever sobre “As minhas pessoas de Coura”, sempre que chegasse ao limite e não tivesse outro assunto. Será em 2025 a primeira edição deste título, com ideias ou sem elas, estas pessoas já merecem. Em novembro provoquei os leitores de Coura quando dei a uma crónica o título “Fui ao teatro a sério.” Então e os treze anos em Coura? E as noites passadas com o TAC no palco do Centro Cultural? E os quilómetros a acompanhar as Comédias do Minho? Foi só uma provocação, despachem-se lá a anunciar as datas do próximo FITAVALE que eu estou desejoso de aí voltar!

Está pronta a crónica número 200. Bate todos os recordes, foi pensada há mais de quatro anos e escrita a mais de três semanas de o jornal ser publicado. (Estou a escrevê-la dia 22 de dezembro!) Como estou numa maré de trabalho antecipado, a minha segunda crónica de janeiro será sobre os desejos para 2025, e lá para 2029 espero ter uma crónica intitulada: 300!


Crónica publicada na edição 493 do Notícias de Coura, 14 de janeiro de 2025



domingo, 22 de dezembro de 2024

Já CHEGA disto.

No passado dia 29 novembro, e quando os deputados votavam o Orçamento de Estado e aprovaram o fim do corte de 5% no salário dos políticos, o partido Chega pendurou tarjas nas janelas da Assembleia da República (AR). O Presidente da AR, José Pedro Aguiar Branco, “considerou esta ação como um momento de vandalismo contra um património nacional” mas não teve a coragem de suspender imediatamente os trabalhos. Quando solicitou a André Ventura que retirassem as tarjas e este se negou a fazê-lo, não devia ter anunciado o que iria fazer, chamava os bombeiros para o fazer e a polícia para identificar os autores de tal vandalismo. E obviamente que é vandalismo, pois se fosse um qualquer cidadão que o fizesse seria preso imediatamente. A imunidade dos deputados não pode chegar para tudo. Faltou também coragem a todos os deputados que pediram a suspensão dos trabalhos e não a viram atendida pelo Presidente da Assembleia da República, deviam ter-se retirado, não estavam garantidas as condições de segurança e tal comportamento era uma séria forma de coação à votação do Orçamento de Estado. André ventura apressou-se a dizer que não era vandalismo, eu queria ver se fosse uma tarja a apoiar as touradas ou a causa LGBT o que ele diria.

Será que já se esqueceram da invasão do Capitólio nos EUA em 2021? E dos ataques aos palácios dos 3 Poderes no Brasil? Não se admirem se dentro de muito pouco tempo acontecer uma coisa parecida em Portugal. Basta ver o que se vai passando nas redes sociais, há grupo radicais infiltrados, especialmente de direita, que incendeiam tudo, querem é agitação, barulho, confusão.

Nos dias seguintes ouviram-se alguns deputados de partidos políticos de esquerda a acusar os deputados do Chega de serem insolentes e mal-educados na Assembleia da República. Não precisamos de provas para acreditar, obviamente que o são, mas dizer só na televisão não chega. Façam chegar essas queixas às autoridades, obriguem o Senhor Presidente da AR a ter pulso forte e coragem para mandar sair da AR os deputados que ofendem outros, porque tem esse poder. E se ele não o fizer, abandonem os trabalhos, ninguém é obrigado a estar no seu local de trabalho, ainda mais na casa da democracia, a ser humilhado dessa forma. Então aceita-se que quando a deputada do PAN, Inês Sousa Real fala sobre touradas, os deputados do Chega gritem “Olés”? Chamo-lhes deputados por respeito a este jornal e aos seus leitores, apetecia-me chamar-lhes outra coisa.

Concordo com algumas das coisas que André Ventura diz, que as fronteiras do país não podem estar escancaradas; que há crimes que deviam ter penas muito mais severas; que há apoios descontrolados a gente que simplesmente não quer trabalhar nem respeita as leis do país, mas jamais votarei num partido que envergonha a própria democracia, e mesmo que tenha vontade de fazer um voto de protesto, não será certamente no Chega. Haja paciência, ninguém tem mãos para pôr esta gente no seu devido lugar? O povo tem mãos, tem pelo menos a mão que segura a caneta no dia do voto. É isto que querem?

Vou terminar com dois ou três apontamentos distintos. Ruben Amorim seguiu o seu sonho e foi para Inglaterra, não tenho dúvidas que será feliz. O Sporting bem tentou disfarçar a perda, mas a avaliar pelos últimos resultados está num período de luto que se recusa a aceitar, e tenho pena. Apesar de não ser sportinguista, habituei-me a gostar das vitórias de uma equipa com um grupo de adeptos fantástico, não mereciam estar a passar por isto. Mas no futebol, quem manda é o dinheiro, temos mesmo de nos habituar! Cá por Portugal também o F.C. Porto vive uma crise de resultados e de falta de dinheiro, mas pelo menos sente-se uma limpeza e honestidade no clube que há muitos anos não se via. Talvez seja melhor assim. 2024 está a acabar, um ano marcado pelo regresso de Donald Trump, pelo escalar da guerra no Médio Oriente e na Ucrânia, por tragédias climáticas, algumas bem perto de nós; pela subida da extrema-direita em cada vez mais países. Se tudo isto não é uma terceira guerra mundial, não estará muito longe.

Desejos sinceros de um feliz Natal e de um próspero ano de 2025!


Crónica publicada na edição 492 do Notícias de Coura, 17 de dezembro de 2024



terça-feira, 10 de dezembro de 2024

Joe Biden: o incendiário.

Joe Biden “foi obrigado” a desistir da corrida às eleições presidenciais norte americanas por motivos meramente políticos. O partido democrata deu-se conta, tarde demais, que a sua idade e condição física, bem como o seu estado mental estavam a deitar tudo a perder, e as sondagens comprovavam-no semana após semana. Foi tão tarde que não lhes restou outra alternativa que não fosse atirar Kamala Harris para o campo de batalha. Durante uns dias a situação parecia querer mudar, mas no final, a derrota foi estrondosa.

Pelo mundo surgiram desde logo grandes indignações, presságios tão assustadores que me fizeram palavras de Passos Coelho quando em 2016 se despediu dos deputados do PSD dizendo: “Gozem bem as férias que em Setembro vem aí o diabo.” Biden também se está a despedir dos Americanos e do Mundo, mas ao contrário de Passos Coelho ele não promete para janeiro a vinda do diabo, ele próprio abre já a porta ao diabo, convida-o a entrar e dá-lhe carta branca para fazer das suas. A decisão de autorizar a Ucrânia a atacar o interior da Rússia com mísseis de longo alcance é pura malvadez política, é uma decisão que põe em risco a segurança mundial, e é tomada única e simplesmente pelo facto de Donald Trump ter ganho as eleições. Trata-se de uma mera armadilha para Trump, para o obrigar a suspender esta decisão e passar por mau da fita! Ser o mau da fita é coisa que de certeza não preocupa minimamente Donald Trump.

Nunca percebi a justificação dada tanto pela América como pela Europa de não autorizar a Ucrânia a atacar, se ajudamos um país dando-lhe armas e munições não devemos impor condições sobre a forma como ele as vai utilizar. É a mesma coisa que dar uma esmola a um pobre e não o autorizar a comprar doces porque lhe vão fazer mal aos dentes. Indo buscar aqui uma inspiração futebolística, a melhor defesa é o ataque, e quem joga para empatar, normalmente perde. A América justificava a proibição de uso de mísseis por serem de fabrico norte-americano, mas a maior parte deles nem sequer são lá fabricados, são de fabrico francês e britânico, apenas tinham o sistema de navegação feito na América. Autorizar agora a Ucrânia a atacar é quase uma ofensa.

Entretanto, Putin mantém o seu discurso ameaçador, e enquanto não houver alguém que verdadeiramente lhe levante a voz, não vai mudar de tom. Na televisão Russa ouvem-se por vezes notícias que afirmam que “Conseguimos atingir Londres em 13 minutos e Paris em 9 minutos.” Putin afirma que testou um novo modelo de míssil balístico de médio alcance, mas que informou os EUA desse teste, que o mesmo foi um ensaio para agora poder começar a sua produção em série. Ao mesmo tempo, o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, considerou que o uso pela Ucrânia de mísseis de longo alcance é um sinal claro de que o Ocidente quer escalar o conflito, e que vai responder diretamente a esses países, afirmando mesmo: “Quem está a lançar esses mísseis não é a Ucrânia, são os países que lhos forneceram.” E pior, Moscovo volta a justificar que o uso de armas nucleares pode ser a resposta a qualquer ataque a território russo.

O conflito está a entrar numa fase demasiado perigosa, e quem vai em janeiro ter um papel decisivo no seu desenvolvimento é, além de perigoso, louco… Donald Trump. Obviamente que não vai terminar a guerra com um telefonema. Nem lhe interessa muito, até porque já deve estar a ter grandes pressões do setor empresarial ligado ao armamento. Se a guerra acabasse, a quem essas empresas iriam depois vender armas e munições? Alimentar a guerra para os lados de Israel e do Irão não seria suficiente. Na minha humilde opinião, a Ucrânia nunca mais vai recuperar os territórios perdidos, e quanto mais tarde abdicar, mais território perderá. (E acredito mesmo que é isto que vai acontecer, Zelensky nunca irá aceitar perder um metro quadrado que seja.) Apesar de tanto a América como o Ocidente terem dito que nunca iriam deixar de apoiar a Ucrânia, mais tarde ou mais cedo vão fazê-lo. Se o não fizerem, teremos mesmo uma guerra de proporções mundiais. Países como a Noruega, Finlândia e Suécia já estão a preparar as suas populações para o pior. Talvez fosse o momento de outros também o fazerem.

Pela leitura das minhas últimas crónicas, os leitores do Notícias de Coura decerto acham que me tornei pessimista e um bocadinho depressivo. É melhor não lhes contar que tripliquei o stock de água, atum, massa, arroz e feijão. A minha geração nunca imaginou viver uma guerra, também nunca imaginámos viver uma pandemia.


Crónica publicada na edição 491 do Notícias de Coura, 3 de dezembro de 2024




segunda-feira, 25 de novembro de 2024

América, Moçambique, Espanha e Portugal.

Já estava destinado que nesta crónica teria de escrever qualquer coisa sobre as eleições americanas. Não me apetece é ocupar tanto texto a falar de Donald Trump, afinal, tenho quatro anos pela frente para o fazer. Desta forma, vou acrescentar mais três países à crónica, infelizmente por maus motivos.

América: Eu sei que me refiro aos Estados Unidos da América, mas, América sempre me soou melhor, a terra das oportunidades, uma terra que ainda desejo conhecer e que, volta meia-volta, me faz sentir um estranho arrependimento, se voltasse a ter quinze ou dezasseis anos, estudaria de forma diferente para emigrar! Mas vamos lá às eleições! Donald Trump foi reeleito, e desta vez ganhou em toda a linha. Mesmo que não se goste, mesmo que se ache um retrocesso, os americanos escolheram, e eles é que tinham de o fazer. Acho um absurdo fazer-se uma sondagem na Europa e concluir que se fossem os europeus a votar, Donald Trump teria pouco mais de vinte por cento. Apesar de ser um sujeito que diz disparates completamente absurdos, é notável ser eleito pela segunda vez para Presidente. E agora? Irá a Ucrânia perder rapidamente a guerra? Irão as mulheres perder os direitos reprodutivos? Irão os estrangeiros ser todos deportados? Esperemos que corra bem, os americanos é que escolheram, mas todo o mundo vai sentir os efeitos.

Espanha: As cheias trouxeram a morte e a tragédia à região de Valência. Sabe-se agora que as mensagens de alerta foram enviadas tarde demais, quando muitos as receberam já estavam retidos pela subida das águas. Tudo foi trágico, imagens desesperantes e surpreendentes, daquelas que só estamos habituados a ver na América ou em África. Para mim, algo que me chocou foi a demora no envio da ajuda. Não é de estranhar que o povo se tenha revoltado contra os políticos e até contra a família real. Na noite em que estou a escrever esta crónica vejo que se prevê chuva muito forte para a região de Valência, chuva que chegará a Portugal dois ou três dias depois. Há dias vi na Internet uma imagem antiga da cidade de Valência, atualmente verifica-se que a cidade ocupou grande parte do que outrora era o rio. Lisboa fez o mesmo nos últimos cem anos. A capital portuguesa está condenada a uma tragédia, só não se sabe quando acontecerá.

Moçambique: Quase a completar cinquenta anos de independência, o país atravessa um dos piores momentos da sua história. Venâncio Mondlane, líder da oposição moçambicana, apela ao bloqueio do país reclamando vitória nas eleições. Os confrontos entre a polícia e a população já causaram vários mortos e feridos. Várias capitais de província estão a ferro e fogo. Sempre fui a favor da independência dos países e da sua autodeterminação, mas muitas das antigas colónias portuguesas nunca mais viveram tempos de paz depois da descolonização.

Portugal: Por cá, o que se passou nos últimos dias com a greve às horas extraordinárias dos serviços do INEM, é inqualificável. A não definição de serviços mínimos levou à morte de 11 pessoas. Não dá sequer para imaginar o desespero de alguém que liga para o INEM porque tem um familiar a morrer, e ninguém atende. E não dá para ter paciência com uma Ministra da Saúde que diz que não sabia do pré-aviso de greve ou que não esperava que tivesse tanta adesão. É mau demais. Obviamente que já se devia ter demitido. Para terminar, não posso deixar de escrever algumas linhas sobre Rúben Amorim. Vai-se embora aquele que foi o treinador mais correto e educado que por cá passou. Deixa o Sporting em 1.º lugar só com vitórias, deixa uma equipa aguerrida e com uma enorme vontade de vencer, que não acredito que vá deixar de ser campeã nacional. O clube e os adeptos despedem-se com lágrimas e com um obrigado merecido, um gesto tão bonito que só mesmo o Sporting seria capaz de ter.


Crónica publicada na edição 490 do Notícias de Coura, 19 de novembro de 2024



segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Fui ao teatro a sério

Este título é uma mera provocação! Antecipo-me desde já neste esclarecimento para poupar os leitores à indignação que decerto iriam sentir caso só no final da crónica viessem a perceber a minha ironia.

Em 2018, no 8.º Fitavale, esse maravilhoso festival itinerante de teatro de amadores do Vale do Minho, o +TAC (o meu Teatro Amador Courense), apresentou em Monção, no Cineteatro João Verde a peça “A Ratoeira” de Agatha Christie. Nesta peça de teatro uma forte tempestade de neve fecha numa pousada um grupo de suspeitos, o assassino está entre eles e só se descobre quem é no fim. O +TAC, fiel a uma série de caraterísticas “que só nós sabemos”, surpreende mais uma vez, não leva a peça até ao fim e deixa em suspense os espetadores! Afinal, quem é o assassino!? A mim, deixou-me na dúvida até agora. Nessa altura, a minha esposa gostou tanto do que viu que só descansou quando conseguiu comprar o livro (e não foi fácil encontrá-lo), e o leu. Nunca lhe perguntei o final. Volta meia-volta falávamos na Ratoeira, e ela dizia-me que gostava imenso de ver de novo a peça de teatro, afinal, é só a peça mais produzida e representada a nível mundial! Um dia destes, eis senão quando, vejo ou oiço a frase “A Ratoeira”, em exibição no Teatro da Malaposta. Não perdi tempo, tratei de reservar dois bilhetes, e não foram os vinte e cinco euros por pessoa que me fizeram sequer ponderar a decisão. (Acho que se contasse ao povo desta região que no Vale do Minho existe uma Companhia de Teatro Profissional, que há vinte anos leva o teatro às aldeias de forma gratuita, lhes chamariam loucos!)

E lá fomos na noite do último sábado ao teatro! Há coisas que são iguais em todo o lado, a animação e agitação do público na entrada, o silêncio que toma conta da sala quando as luzes se apagam, um ou dois espetadores que entram em cima da hora… e depois, quando se abrem as cortinas, consigo sentir aquilo em que o dinheiro consegue fazer a diferença! O cenário é maravilhoso, é de época, tudo é tão verdadeiro que parece que fizemos uma viagem no tempo e estamos mesmo em meados do século XX. Estranhamente, quando fiquei encantado com o cenário lembrei-me de quando em 2008 o TAC apresentou “Vinho, copos e milagres”, uma peça de Tânia Rico. O nosso cenário eram vinte ou trinta grades de cerveja e frisumo vazias, presas com braçadeiras, com elas fizemos um balcão, uma porta e uma bancada onde nos sentámos! “A necessidade aguça o engenho”, é uma das coisas que aprendi com o teatro. E nunca isso foi limitação para chegar ao fim das peças com o coração cheio e a alma a rebentar de emoção! Em palco é tudo mais ou menos igual, um ou outro pequeno atropelo nas falas, um ou outro tropeção nas palavras, iguais a nós, portanto. Diferente é apenas a presença em palco de Ruy de Carvalho, com 97 anos é o ator mais velho do mundo ainda em atividade. Quando a sua personagem entra pela primeira vezem palco, o público aplaude-o. É merecido, obviamente que também o fiz, foi mais uma novidade, até este dia só estava habituado a bater palmas no fim. Durante a peça ouve-se o público rir algumas vezes, se fosse pelo Minho decerto teria reconhecido as gargalhadas da Cátia Sousa, da Sofia Brito ou do Luís Filipe Silva, seria capaz de as reconhecer em qualquer parte do mundo.

No final, fecha-se a cortina e ouvem-se os aplausos, os atores vêm agradecer, o público levanta-se e continua a aplaudir até que, Ruy de Carvalho pede silêncio… agradece emocionado e tal como na primeira representação desta peça, em 1952 em Londres, pede ao público segredo: -“Não contem a ninguém quem é o assassino!”

Saí da sala feliz, fiquei a conhecer o final da história, vi ao vivo talvez o melhor ator da história em Portugal, e percebi que o teatro pode ser um negócio rentável e muito bonito. Faltou-me aquela parte final em saltava para o palco para dar os parabéns aos atores, aquela parte em que nos últimos anos lhes tenho dito que quando os vejo, sinto imensa vontade de lá estar. O teatro foi umas das melhores coisas que trouxe de Paredes de Coura, e será uma das coisas que certamente me fará voltar enquanto a vida o permitir. Alegro-me ao pensar que já não falta muito para o próximo Fitavale!

Crónica publicada na edição 489 do Notícias de Coura, 5 de novembro de 2024