terça-feira, 13 de outubro de 2020

Tu és o quê!? Influencer!?

Mas isso é lá profissão!? Influencer!? Mas quem afinal influencias tu com os teus vídeos de 10 segundos sobre perfumes, suplementos alimentares e roupas!? 

Já andava para escrever sobre este tema há uns tempos. Numa primeira fase até pensei em usá-lo para uma daquelas minhas crónicas intituladas “Coisas que me irritam”, mas este tema tem tanto para dizer que merece uma crónica inteira. 

Têm surgido aos milhares na rede social Instagram. Denominam-se influencers, em português, influenciadores digitais. O que fazem é simples, juntam uns milhares de seguidores e vão publicando vídeos onde fazem publicidade “positiva” de vários tipos de produtos, roupas, calçado, suplementos alimentares e perfumes são talvez os mais vistos, mas já se vê de tudo, material escolar, hotéis e até comida para animais! 

Quando os influencers se dedicam apenas a algumas marcas ou tipos de produtos até lhe podemos dar alguma credibilidade, agora quando começam a aconselhar e a “dar a cara” por centenas de produtos e de todo e qualquer tipo, não me parece que influenciem quem quer seja. Pelo menos, quem seja minimamente inteligente para perceber aquilo em que deve acreditar. Por esta razão, algumas marcas já não se interessam pelos utilizadores que mais seguidores têm, nestes casos a ligação com o público perde-se, perde-se o lado intimista e verdadeiro. Tudo isto faz-me lembrar um bocadinho as pequenas mercearias de bairro, a oferta é muito menor, mas a relação que se estabelece com quem nos serve é por vezes compensadora, e os preços, nem sempre são assim tão diferentes. Algumas pessoas ficariam absurdamente impressionadas se comparassem os preços de alguns produtos na pequena mercearia, com os preços dos grandes hipermercados. 

Não tenho nenhum tipo de inveja contra esta nova “espécie humana”, aliás, conheço até algumas destas personagens que graças a uma cara e um corpo bonito, somam e seguem nas redes sociais. E fazem muito bem! Aproveitem esta oportunidade enquanto ela existe. Já não me merecem tanta consideração as outras “personagens”, adultos responsáveis que “administram” os perfis das suas crianças, pequenos influenciadores digitais que têm a sua imagem a circular por esse mundo fora, quem sabem por onde, quem sabe entre quem. Faz-me lembrar uma piada que costumava ouvir a um professor, meu colega e amigo, que em jeito de brincadeira dizia: “Os meus filhos nunca mais fazem 18 anos… estou farto de viver à custa dos meus Pais, está na altura de viver à custa dos meus filhos”! 

Na verdade, o tema Influencer não me irrita nada, já quando se dizem produtores de conteúdo, aí sim, despertam em mim uma personagem revoltada. Mas onde está o conteúdo de um vídeo onde se ouve: - “Olhem que giras estas sapatilhas da Adi&#$ que eu recebi, são super fofas e super confortáveis, e têm cordões que dão para ajustar e eu posso até trocar os cordões por estes de outra cor!”. Perdoem-me lá mas, conteúdo zero. Este tipo de conversa até pode ser gira para algumas pessoas, mas daí até ser conteúdo… vai uma grande distância. Conteúdo é um vídeo com a análise por exemplo de um computador, onde o mesmo é testado e as suas caraterísticas são descritas e comparadas; conteúdo é uma vídeo-aula de alguém a explicar o Teorema de Pitágoras; conteúdo é um documento de opinião sobre por exemplo a interrupção voluntária da gravidez; conteúdo é uma infografia sobre por exemplo a Paisagem Protegida de Corno de Bico; conteúdo é um podcast do poema “A casa em que nasci, Marianinha” de Aquilino Ribeiro… conteúdo requer trabalho, investigação, pensamento, opinião… Eu sei aquilo em que estão a pensar, e é verdade… provavelmente o poema vai ter 30 visualizações e o vídeo das sapatilhas 30000… tenhamos esperança que um dia a nossa sociedade não possa ser qualificada por este tipo de comportamentos. 

Sejam influenciadores digitais, e continuem a aproveitar essa oportunidade, mas não se digam produtores de conteúdo. Por respeito a vós mesmos. Não se achem aquilo que não são.


Crónica publicada na edição 395 do Notícias de Coura, 6 de outubro de 2020.



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