Não foi com surpresa que ouvi o anúncio da vitória de Nicolas Maduro para um novo mandato como Presidente da Venezuela. Estranhei os números, anunciarem uma vitória com apenas 51% acaba por ser uma piada, ofensiva para o povo, que sabe perfeitamente que não foi assim que votou. Mas pior, a soma total do Conselho Nacional Eleitoral é superior a 100%. (Também por lá os resultados da matemática são preocupantes)! Na Venezuela as eleições estão longe de ser livres, a comunicação social é controlada pelo partido de Nicolás Maduro, a comissão eleitoral é nomeada pelo governo, observadores internacionais independentes são impedidos de entrar no país e existe pressão do governo sobre os funcionários públicos para colocarem a cruz no candidato certo.
Também não foi surpresa ver a Rússia e Cuba serem dos primeiros países a saudar a vitória de Maduro. Infelizmente, acabou por não ser surpresa ler o comunicado do PCP: «O PCP saúda a eleição de Nicolás Maduro como Presidente da República Bolivariana da Venezuela, bem como o conjunto das forças progressistas, democráticas e patriotas venezuelanas. O PCP (…) condena a reação do Governo português, alinhada com a política de ingerência dos EUA e da UE e quantos procuram animar a campanha promovida pela extrema-direita golpista.»
Continuam a ser lamentáveis as posições do PCP em matérias que envolvem regimes ditatoriais, Venezuela e Rússia são os exemplos mais recentes. Não é de estranhar que a cada ato eleitoral o PCP registe sempre piores resultados. Um partido que já teve mais de um milhão de votos e mais de quarenta deputados no início da década de oitenta do século passado, reduz-se hoje a pouco mais de duzentos mil votos e quatro deputados. Pior do que ser um partido envelhecido, é um partido que mesmo na voz dos mais jovens mantém o discurso do passado. Os eleitores fiéis ao PCP estão todos a morrer, o discurso não atrai militantes, é uma questão de tempo, e não muito, até o PCP desaparecer da Assembleia da República. Depois, vai-lhe acontecer provavelmente como ao CDS-PP, só voltará se se tornar a bengala de apoio de alguém.
É um facto que devemos ao PCP muita da luta contra a ditadura, mas fomos um país que teve a sorte de em novembro de 1975 o PCP não conseguir ter armas suficientes para mandar o povo para a rua, e desta vez certamente não seriam cravos que iriam sair das mesmas. (Estava escrito no programa do partido, depois do 25 de abril e da revolução democrática nacional feita, temos de avançar para a insurreição popular armada.) Diz-se que é um exagero quando alguém diz que foi graças ao 25 de novembro que Portugal não se tornou na Cuba da Europa. Sinceramente, já acreditei menos nisso.
Voltando à Venezuela, como é que um país que possui as maiores reservas de petróleo do mundo, com imensas fontes de gás natural e rico em diamantes, tem o povo a viver na miséria, com um salário médio de pouco mais de duzentos dólares e onde um cabaz de bens essenciais custa quinhentos? A resposta é simples, o problema está nos dirigentes políticos, ditadores apoiados em forças policiais e regimes judiciais corruptos. Os regimes de Hugo Chávez e Nicolás Maduro levaram mais de vinte por cento dos Venezuelanos a deixar o país. Estimam-se em mais de três milhões os venezuelanos espalhados pelo mundo, sendo cerca de quarenta e cinco mil no nosso país, números que provavelmente vão aumentar nos próximos tempos. Quase todos nós conhecemos alguém vindo da Venezuela, gente humilde, trabalhadora e com água nos olhos quando se fala do seu país, da necessidade em fugir da pobreza e da fome, e da saudade que carregam dos familiares que lá ficaram.
No dia que termino de escrever esta crónica, já há mortos nas manifestações que se vão fazendo na Venezuela. Gostava muito que quando este artigo chegasse às mãos dos leitores a paz reinasse no país.
Desejos de boas férias, se for o caso. E bom festival!
Crónica publicada na edição 484 do Notícias de Coura, 6 de agosto de 2024